Médicos defendem a volta de remédios inibidores de apetite
Na infância, o peso nunca foi um problema para a jornalista Antônia Rodrigues, 51 anos. Afinal, ela sempre foi uma criança magra. Já na adolescência, tudo mudou. Ela tem histórico familiar por parte da mãe, e chegou a pesar 80 kg, o que parece pouco, mas é preciso considerar que ela tem somente 1,60 m. Sentindo-se muito culpada por comer muito e ainda sofrer preconceitos dos amigos por causa do peso, aos 25 anos, Antônia resolveu emagrecer. Para isso, na época, ela procurou um endocrinologista e perdeu quase 20 kg com o uso dos medicamentos anorexígenos.
Porém, para manter o peso, ela recorreu a um remédio inibidor de apetite, a anfepramona, hoje proibida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A jornalista conta que seu médico explicou que ela possui uma falha de funcionamento na parte do cérebro responsável pela sensação de saciedade, que envia comandos de fome quando o estômago já está cheio.
— Essa falha desencadeia ansiedade e certo descontrole emocional em relação à questão alimentar. A anfepramona simplesmente corrigia essa disfunção.
Antonia ainda diz que, com a chegada da menopausa, essa situação se agravou ainda mais, especialmente com a proibição do tratamento antiobesidade.
— Usei a anfepramona por mais de 20 anos, mas não tenho mais acesso aos medicamentos, por causa da proibição. Sempre fiz atividade física, tenho estilo de vida saudável, evito carne de porco, não como muita carne vermelha, sempre como frutas e, mesmo assim, não consigo manter o peso. Por isso, luto incansavelmente há quatro anos pela volta dos inibidores para garantir a qualidade de vida para as pessoas.
De acordo com os médicos, os inibidores de apetite, como também são conhecidos, são opções farmacológicas promissoras no combate à obesidade, já que atuam no sistema nervoso central e diminuem a sensação de apetite do obeso.
A venda de anfepramona foi proibida pela Anvisa, em 2011, assim como do mazindol e do femproporex, ambos inibidores de apetite ou anorexígenos. De acordo com a agência, a proibição aconteceu porque “os medicamentos não tinham sua eficácia comprovada”.
Porém, após a medida da Anvisa, a jornalista conta que muitos pacientes que necessitavam dos remédios ficaram reféns do mercado negro.
— Depois da proibição o mercado negro caiu matando. Sou completamente contra, mas muitas colegas são aliciadas por pilantras. De início, os remédios tinham muita farinha ou então algum tipo de analgésico nas cápsulas, mas também têm pó de mármore. Os valores são absurdos, tipo R$ 500 por 30 cápsulas. Antes disso, a pessoa gastava, no máximo, R$ 30. A pessoa paga tudo isso e o produto é uma porcaria que faz mal e não tem efeito nenhum.
O novo regulamento aprovado pela agência prevê que as empresas interessadas em comercializar medicamentos contendo mazindol, femproporex e anfepramona deverão requerer novo registro à Anvisa. Em nota ao R7, a assessoria de imprensa informou que “a análise técnica dos pedidos levará em consideração a comprovação de eficácia e segurança dos produtos. Até o momento, não há solicitação de registro desses medicamentos”.
De acordo com números da Abran (Associação Brasileira de Nutrologia), desde a proibição dos anorexígenos, 8% da população aumentou de peso. Segundo a associação, quase 16 milhões de brasileiros estão mais gordos e sofrendo com as doenças relacionadas à obesidade, explica o médico nutrólogo e diretor da associação, Dimitri Homar.
— Aquele paciente que voltava mais gordo ao meu consultório, não estava somente mais gordo, mas tinha se tornado diabético, outros pós-infartados, outros tiveram derrame etc. Então, hoje, eu tenho que cuidar do meu paciente para fazer ele perder peso e ainda cuidar de todas essas comorbidades. A saúde do brasileiro ficou pior. Por que retirar um produto que já tem mais de 50 anos no mercado, que nunca teve relato de óbito? Se eu posso prevenir, por que que eu tenho que esperar acabar com a saúde da pessoa para depois cuidar?
O vice-presidente e médico nutrólogo da Abran, Paulo Giorelli, disse que depois da proibição dessas drogas houve um aumento de 32% na venda de medicamentos para pessoas com diabetes e hipertensão. O médico ainda conta que uma pesquisa da realizada por especialistas da associação com cerca de 3.000 pacientes comprovou a eficácia dos remédios em longo prazo.
— A obesidade é uma doença crônica que possui diversas causas. Em 75% delas, o tratamento deve incluir medicamentos. Quando isso não acontece, o paciente volta a ganhar peso e desenvolve diversas doenças associadas, como a diabetes e a hipertensão, por exemplo.
Essas doenças crônicas são perigosas, e o endocrinologista João Alberto Ferreira Matos explica que, como em todas as doenças crônicas, não se pode interromper o tratamento.
— Muita gente coloca que o obeso é preguiçoso, que come escondido, que não se cuida, mas é uma grande mentira. As pessoas que são contra o medicamento dizem que ele não presta porque, quando para de tomar, a pessoa engorda novamente, mas essa é a maior prova de que realmente funciona. Um medicamento para diabetes, um medicamento para hipertensão, se você interrompe, a doença volta. Isso é sinal de que o medicamento estava te protegendo.