'Não pode ter medo', diz brasileira que retirou ovários e trompas como Jolie
Brasileiras que retiraram ou vão retirar os ovários e as trompas de falópio, assim como fez a atriz norte-americana Angelina Jolie, disseram ao G1 que a opção pela cirurgia preventiva foi ou é a decisão mais correta para se protegerem do câncer.
Nesta terça-feira (24), a ganhadora do Oscar divulgou que realizou o procedimento quase dois anos após fazer uma mastectomia (cirurgia para retirar os dois seios) para evitar um câncer de mama, que já havia vitimado familiares próximos dela, como sua mãe.
Angelina optou pelas operações depois de detectar em um exame de sequenciamento genético uma mutação no gene BRCA1.
A presença desta mutação (que pode atingir também o gene BRCA2) é hereditária e aumenta em 87% o risco de uma mulher ter câncer de mama. O risco de desenvolvimento de câncer de ovário também sobe 50%.
‘Mais tranquila’
Na próxima semana, a advogada Ana Silvia Peliciari, de 49 anos, será operada para retirar os ovários, as trompas e o útero para prevenir o câncer. Mãe de dois filhos, a moradora de Santo André (SP) detectou tumores na mama em 2013.
Ela realizou a cirurgia de mastectomia no mesmo ano e fez seis sessões de quimioterapia. Durante o tratamento, um exame genético apontou que Ana é portadora de mutação no gene BRCA2. O fato não a preocupou. Em vez disso, a incentivou a decidir pela nova operação.
“A oncologia é uma ciência preventiva, porque depois que [a doença] chega, o jogo vira”, disse Ana Silvia. “Não se pode ter medo de investigar uma questão de saúde. Com o avanço da medicina, você tem meios de eliminar [o problema] e salvar a sua vida se tiver a doença no começo. A frase ‘quem procura, acha’ é falha não se encaixa para a medicina”, afirmou.
Ana Silvia disse ao G1 que ao saber da decisão da atriz Angelina Jolie, sentiu que havia escolhido corretamente a opção de remover os órgãos. “Me sinto mais tranquila e faria 10 vezes a mesma coisa. Não vale a pena ficar com uma pulga atrás da orelha”, comentou.
'Doença causa medo'
A psicóloga Ana Letícia Rodrigues Nunes, de 45 anos, descobriu que possuía uma mutação em um dos seus genes após tratar um câncer de mama, que a fez retirar parcialmente uma das mamas em 2013.
Na análise genética, ela soube que era portadora do gene RAD-51C, coativador do BRCA e que também pode provocar neoplasia. Seus médicos então recomendaram a retirada dos ovários e das trompas como forma de prevenção.
Na última semana, a moradora de São Paulo passou pelo procedimento, feito por laparoscopia. Ela disse não se importar com os efeitos colaterais, como a menopausa precoce, e que prefere pensar que evitou o grande risco de ter novamente o câncer, “uma doença que causa medo e morte, mas que pode ser evitada com intervenções precoces”.
“Se eu fosse mais jovem, eu teria pensado mais. Como eu já tenho filhos e não pretendo ter outros, pela minha idade foi uma decisão mais sábia. Claro que a gente se preocupa por ser uma cirurgia, com anestesia geral (...) mas essas coisas a gente pode contornar de uma maneira, ao contrário de um câncer de forma avançada”, complementa.
Câncer pouco detectado
O Instituto Nacional de Câncer, o Inca, afirma que o câncer de ovário é um dos mais difíceis de serem diagnosticados e o de menor chance de cura. A estimativa é que 5.680 novos casos tenham sido detectados no Brasil em 2014. Esse tipo de tumor mata por ano pouco mais de 3 mil mulheres no país, de acordo com o Inca.
Segundo o médico Felipe Melo Cruz, coordenador do departamento de oncologia do Instituto Brasileiro de Controle de Câncer (IBCC), não há sinais que levem a uma investigação precoce sobre a presença deste carcinoma. “Por causa disso, na maior parte dos casos, o tumor é detectado em sua forma avançada. Esse sintoma é visto quando há aumento do volume do abdômen”, disse Cruz.
Desde janeiro de 2014, exames indicados para detectar mutações em genes como o BRCA1 e BRCA2 são obrigados a serem cobertos pelos planos de saúde. O custo de uma análise como essa para um cliente particular chega a R$ 6.700.
Em fevereiro do ano passado, o Sistema Único de Saúde (SUS) publicou portaria que criando a política nacional para doenças raras, que incorporou 15 novos exames, incluindo o aconselhamento genético. Por ser uma norma recente, os milhões de pacientes da rede pública ainda não têm acesso completo à técnica.
Por isso, segundo o médico, nesses casos a melhor forma de prevenção é um acompanhamento regular com ginecologista para a realização de ultrassom na região pélvica. A recomendação deve ser seguida principalmente por quem tem histórico de câncer de mama na família, em parentes de primeiro grau (mãe ou irmão) ou familiares mais próximos.
Essas pessoas têm maior risco de desenvolver a doença no ovário porque há grande chance delas terem mutações genéticas. “O acompanhamento deve ser mais intenso”, diz o médico.