Sindicato dos Aeroviários no Estado de São Paulo
Sábado, 23 de Novembro de 2024

Proposta para mudar investigação de acidentes aéreos recebe apoio em SP

28/06/2012

 

Familiares de vítimas de acidentes aéreos e integrantes do Ministério Público apoiaram a proposta do ex-chefe do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) de que o país deve criar um órgão autônomo para apurar as tragédias da aviação civil brasileira.
 
“Para mim a melhor alternativa é uma agência independente, sem militares e fora da esfera federal, que tenha pessoas com mandato fixo e com conhecimento para isso e que não possam ser contratadas depois por empresas aéreas, para que haja isenção e seja imune a interesses”, disse o promotor Mário Sarrubbo, que apurou o acidente da TAM em 2007, quando 199 pessoas morreram após colisão no aeroporto de Congonhas (SP).
 
“Sou a favor da ideia do Kersul. Uma agência autônomo seria a alternativa desde que haja capacitação e pessoal neutro, não envolvido ou trabalhando em companhias aéreas. A sociedade civil também deve poder participar”, defendeu Sandra Assali, presidente da associação nacional de parentes de vítimas de acidentes aéreos no país.
 
Tanto ela quanto os representantes de familiares das tragédias da Gol, que deixou 154 mortos após um choque no ar em 2006, e da TAM, querem, contudo, que seja obrigatório que empresas e órgãos cumpram as normas de segurança. Atualmente, o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aéreos (Cenipa), da Aeronáutica, emite apenas “recomendações” para impedir que os acidentes ocorram, que podem ou não ser colocadas em prática.
 
“Muitos acidentes poderiam ter sido evitados. Na véspera do acidente da TAM, um piloto falou que quase tinha quase saído da pista, e o Cenipa alertou e fez recomendações sobre a situação da pista em dias de chuva e, no dia seguinte, a tragédia ocorreu”, relembrou Archelau Xavier, que perdeu a filha no caso.
 
As afirmações foram feitas durante evento na manhã desta quarta-feira (27) na Escola Superior do MP paulista, onde parentes de vítimas, promotores, juízes, militares e representantes dos sindicatos das empresas e dos pilotos discutiram um projeto de lei que busca que as informações obtidas na investigação de tragédias aéreas não sejam usadas para fins criminais ou responsabilização civil.
 
O projeto de lei 2453, de 2007, tramita no Congresso e já foi aprovado em todas as comissões, mas ainda não há previsão de ir a votação em plenário.
Na ocasião, o atual chefe do Cenipa, brigadeiro Luis Roberto Lourenço, anunciou que o órgão começou a trabalhar em conjunto com Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) para que as recomendações emitidas para prevenir novos acidentes sejam realmente colocadas em prática. “Nos últimos relatórios o Cenipa passou a enviar as recomendações à Anac, que vai impor e fiscalizar se serão cumpridas. Isso deve estar completamente em funcionamento ainda neste ano”.
 
 
Expertise militar
 
Procuradores, promotores de Justiça e juizes ouvidos durante o evento questionaram se uma agência teria isenção e qualificação necessária para assumir esta competência.
 
O ex-secretário de Justiça de São Paulo e procurador Luiz Antonio Marrey diz que a ideia de Kersul, como "profundo entendedor da área" deve ser respeitada, mas pediu um diálogo na sociedade sobre qual o caminho a seguir no país antes de qualquer mudança.
 
Ele também questionou se há melhor capacitação para a apuração de acidentes aéreos do que a militar. “Duvido que haja maior expertise nesse setor do que no Cenipa, não sei se a Polícia Federal consiga fazer isso hoje”.
“Não é porque em outros órgãos do mundo é uma agência que aqui devemos copiar. Isso deve ser analisado melhor, é um tema delicado para se mudar bruscamente, não é tão simples dizer que deve ser civil ou deve ser militar”, defendeu. Concorda com ele Dario Scott, da associação dos familiares da TAM: “Não sei se sair das mãos do Cenipa seria a melhor alternativa”, ponderou.
Já o procurador Rodrigo de Grandis, que denunciou à Justiça a Anac e dois diretores da TAM por responsabilidade penal na tragédia, questionou a independência que o órgão que apura acidentes deve ter. “Precisamos verificar se a agência reguladora realmente tem isenção suficiente para investigar”, disse.
O juiz Edmundo Lellis Filho, que também é aviador, apontou que "grande parte das entidades investigativas no mundo são agências autônomas, não são órgãos atrelados à administração pública federal, muito menos a militares".
 
Durante o seminário, o MP questionou pontos jurídicos do projeto de lei defendido pelo Cenipa para proteger os dados da investigação. Para os promotores, as informações são públicas e devem ser usadas na esfera jurídica. Já o brigadeiro Lourenço defendeu que, conforme tratados internacionais, a apuração do Cenipa busca prevenir que novos casos ocorram e que o uso das conclusões dos militares em busca de culpa ou de indenizações poderia prejudicar os militares a descobrir as causas das tragédias e impedir que novos casos ocorram.