Pauta Feminina discute resultados da 2ª Conferência Nacional de Saúde da Mulher
A valorização da diversidade feminina, da “desmedicalização” e da discussão de gênero marcaram a 48ª Pauta Feminina, realizada na sala 13, da Ala Alexandre Costa, do Senado Federal, para analisar os resultados e desafios da 2ª Conferência Nacional de Saúde da Mulher. Cerca de 50 pessoas participaram da atividade organizada pela Procuradoria Especial da Mulher do Senadoe e pela Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados, entre outros parceiros.
Recém-chegada da Rússia, onde participou da 137ª Assembleia da União Inter-Parlamentar, a procuradora Especial da Mulher do Senado, Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), exibiu as tabelas elaboradas pela consultoria do Senado, que relacionam a violência contra a mulher à falta de espaçosa para sua participação política.
- Há uma relação entre estas duas tabelas que mostra que a falta de empoderamento nos fragiliza, nos vulnerabiliza, e nos transforma em objetos, sujeitas à violência, à opressão, à depressão e às doenças - disse Vanessa.
Kátia Souto, da Coordenação de Saúde das Mulheres do Ministério da Saúde, destacou o peso do movimento de mulheres na transformação de políticas de saúde materno-infantis e em políticas para mulheres, independente de serem mães ou não, bem como alguns marcos, como a própria 1ª Conferência de Saúde da Mulher, realizada em 1986, da qual ela se orgulha de ter participado.
Gênero
Realizada entre 17 e 20 de agosto de 2017, 31 anos após a primeira, a 2ª Conferência de Saúde das Mulheres deu voz e visibilidade a pauta de saúde de muitas expressões do feminino, valorizando a interseção do gênero com outras variáveis, como raça, orientação sexual, condição de trabalho, idade etc.
Kátia Souto disse que o gênero é um grande fator inferiorizador da condição das mulheres, que tendem sempre a receber menos pela remuneração das atividades laborais onde são mais numerosas.
- Mesmo na saúde, existe essa hierarquia, com as mulheres recebendo menos por seu trabalho na enfermagem, na psicologia, e os homens recebendo muito mais nas áreas em que ainda há menos mulheres, como neurocirurgia - disse.
Ronald Santos, presidente do Conselho Nacional de Saúde, organizador da conferência, disse que, no momento atual, a lutas das mulheres na saúde têm um grande valor civilizacional diante da “blitz nazista” que ameaça conquistas na saúde, na ciência e tecnologia, na economia e na seguridade social.
Desmedicalização
Segundo os organizadores da 2ª Conferência de Saúde das Mulheres mais de 300 propostas foram encaminhadas por mulheres brancas, negras, quilombolas, de matriz africana, indígenas, ciganas, lésbicas, bissexuais, travestis, transexuais, mulheres com deficiência, mulheres com HIV e Aids, mulheres escalpeladas, mulheres privadas de liberdade, mulheres em situação de rua, ribeirinhas, pescadoras, marisqueiras, trabalhadoras, jovens, idosas e profissionais do sexo.
Entre os pontos que destacou, Kátia Souto mencionou a “desmedicalização" do corpo feminino e do atendimento à saúde e a importância da “corresponsabilização masculina no campo da saúde reprodutiva, tradicionalmente sempre entendida como um problema que diz respeito apenas às adolescentes.
A conferência valorizou saberes tradicionais como os das parteiras. “Há uma simbologia construída no sentido de que não podemos sentir dor”, disse Kátia Souto, o que favorece a opção pela realização de cirurgias como cesáreas, em vez da opção por ter um parto natural.
Exclusão
Elisa Costa, presidente da Associação Internacional Maylê Sara Kalí (AMSK/Brasil), uma das duas ciganas rromani que participaram da Conferência, disse que “o nome 'cigano' foi dado por não ciganos já com um recorte de exclusão”. No cotidiano, a exclusão se materializa desde o impedimento de acesso em prédios públicos, sob a alegação de que as pessoas não podem “entrar fantasiadas”, e como à cobrança de um endereço residencial, como forma de ter acesso a serviços públicos.
Paula Benett, assessora Especial da coordenação de Diversidade LGBT do governo de Brasília e integrante do conselho da Mulher do DF, disse que no Brasil há uma espécie de pirâmide de hierarquização das pessoas.
- Nessa pirâmide, no topo está o homem, que deve ser branco, rico, jovem, cisgênero, heteronormativo, soronegativo; no outro extremo, vem a pessoa que é mulher, negra, pobre, idosa, trans, soropositiva, de orientação homossexual - disse.
Segundo ela, essa pirâmide tem como um dos seus fundamentos um binarismo que identifica os homens pelo pênis e as mulheres pela vagina, punindo as pessoas que fazem a transição entre um gênero e outro e, também, as pessoas não binárias. Para ela, a luta por equidade na saúde passa pelo entendimento de que a equidade implica no cultivo do respeito e da empatia ao outro.
Coragem
Eliane Nascimento, funcionária da liderança do PCdoB na Câmara dos Deputados, emocionou a todos com sua história de superação do primeiro câncer que teve, há 18 anos, que levou a perda uma das mamas, mas não a impossibilitou de amamentar a outra filha que nasceu e à qual deu o nome de Vitória. Mãe de um filho portador de necessidades especiais, ela não fez a cirurgia reparadora, por não ter tempo para repousar.
Ela deixou um recado para as pessoas que temem fazer o rastreamento do câncer com medo de descobrir a doença: - Vão-se os anéis, ficam os dedos. Eu prefiro uma vida um peito. Não se sintam menos por um peito só. Sintam-se mais, porque somos mulheres de peito, de coragem - disse.
A Pauta Feminina teve a participação da presidente do Fórum de Mulheres do Mercosul, Emília Fernandes, primeira secretária de Política para Mulheres e ex-senadora pelo Rio Grande do Sul – que também assumiu a mediação da mesa; de Nahida Rahman Shumona, ministra da Embaixada de Bangladesh; de Veronique Durand, pesquisadora e autora de Órfãs de Esperança – Violência contra a Mulher, com relatos de mulheres de cinco países, entre os quais Bangladesh e o Brasil; de Ericka Filipelli e Stella Matta Machado, da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres; de Marina Tavares, do Ministério do Esporte, entre outras.